domingo, junho 25, 2006

Em "terra de ninguém"

O conceito de "refugiado" ainda hoje é debatido pelos académicos que se ocupam dos assuntos da sociologia e antropologia. Mas, enquanto nas universidades se discute a diferença entre "refugiado" e "deslocado", nos campos onde estes se encontram, ou à deriva pelos caminhos, a realidade não se compadece com rótulos nem conceitos e trata-os a todos da mesma forma.
Sem perspectivas de futuro, assemelham-se a fantasmas errantes, à procura de um sítio onde possam repousar, beber, comer, vestir, criar os filhos. Confinados a uma "terra de ninguém", ali estão, tão indefesos e impotentes como as crianças de ventre inflamado que embalam nos braços esqueléticos. Com a pele colada aos ossos e o rosto enigmático de quem fugiu de um pesadelo para mergulhar noutro, vão deixando para trás o brilho dos olhos, os sonhos, a esperança...
Às vezes vemo-los, imóveis, à nossa frente, emoldurados num ecrã último modelo, enquanto nos recostamos no sofá, quem sabe, a pensar nos azares da nossa vidinha...
Outras vezes, vêm pedir-nos asilo, mas esbarram com a interminável burocracia dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras, porque na Europa e em todo o hemisfério norte a diferença entre "refugiado" e "emigrante" já foi há muito discutida e legislada. Noutra "terra de ninguém", lá vão apelando, como podem, a um humanismo cada vez mais submerso por papéis e decretos, para provarem que "merecem" a "sorte" que a vida lhes reservou. Para não serem confundidos com "oportunistas" à procura de emprego. Como se pode "merecer" a dor de ter de fugir?
Enquanto estão nos campos, nós olhamos para eles, através da moldura das notícias, mas eles não falam. Todas as suas forças se renderam ao pó dos caminhos que percorreram descalços, com os filhos nos braços a desfalecer de fome e sede. A sua voz ficou lá longe, no lugar de onde vieram e onde eram gente...
Nós vemo-los, entre o compacto do futebol e as últimas da "política" nacional, disfarçamos uma lágrima atrevida... e mudamos de canal...


ONU: número de refugiados desceu para 8,4 milhões em 2005

O número de refugiados no mundo em 2005 foi o mais baixo dos últimos 26 anos, mas houve mais 1,2 milhões de deslocados internos em relação ao ano anterior, de acordo com um relatório divulgado [este mês] pela ONU.



O relatório global sobre refugiados em 2005, divulgado pelo Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR), refere que o número de refugiados desceu de 9,5 milhões em 2004 para 8,4 milhões no ano passado.

No entanto, o número de deslocados internos aumentou de 5,4 milhões em 13 países para 6,6 milhões em 16 países, de acordo com o documento.

O Alto-Comissário para os refugiados, António Guterres, considera que a redução do número de refugiados no mundo é «uma boa notícia», bem como o regresso de mais de seis milhões de pessoas aos seus países de origem desde 2002.

Quanto aos deslocados internos, o ex-primeiro-ministro português considera que as situações mais preocupantes se registam em Darfur, no Sudão, no Uganda e na República Democrática do Congo.

«Conseguimos ajudar centenas de milhares de deslocados internos a regressar às suas casas na Libéria, na Federação Russa ou nos Balcãs, mas muitos milhões vivem ainda como refugiados nos seus próprios países e precisam de muito mais ajuda do que a que recebem actualmente», disse Guterres.

Segundo o relatório, o número de deslocados internos representa 32 por cento dos cerca de 21 milhões de pessoas que recebem assistência do ACNUR, enquanto os refugiados são 40 por cento do total.

Esta agência da ONU apoia ainda 1,6 milhões de refugiados e deslocados que regressaram a casa, 773.000 requerentes de asilo, 2,4 milhões de apátridas e 960.000 pessoas que não conseguiram asilo apesar de precisarem de protecção.

Segundo o ACNUR, estes números não incluem os 4,3 milhões de refugiados palestinianos, que estão sob responsabilidade da Agência da ONU para a Ajuda Humanitária.

O relatório refere ainda que metade das pessoas que precisam de ajuda do ACNUR diz respeito a cinco nacionalidades: afegãos (2,9 milhões), colombianos (2,5 milhões) iraquianos (1,8 milhões), sudaneses (1,6 milhões) e somalis (839.000).

De acordo com o documento, o número de refugiados diminuiu 31 por cento desde 2001, passando de 12,1 milhões para 8,4 milhões.

Em relação à Europa, houve uma redução de 15 por cento no ano passado, mas este continente acolhe cerca de um quarto do número de refugiados, enquanto a Ásia e Pacífico acolhem 10 por cento e as Américas recebem sete por cento.

O relatório do ACNUR refere ainda que, desde 2002, 4,6 milhões de pessoas regressaram a casa. Só no ano passado regressaram 1,1 milhões, dos quais 752.000 para o Afeganistão, 70.000 para a Libéria, 68.000 para o Burundi, 56.000 para o Iraque e 54.000 para Angola.

O número de requerentes de asilo foi de 668.000 em 149 países, no ano passado, um decréscimo de apenas dois por cento em relação ao ano anterior. A maioria dos pedidos de asilo diz respeito à Europa, com 374.000, seguindo-se África (125.000), Ásia e Pacífico (75.000) e Américas (72.000).

O ACNUR foi criado em 1951 com o objectivo de proteger e apoiar os refugiados e a sua acção destinava-se apenas a pessoas que atravessavam a fronteira em busca de protecção.

No ano passado, as Nações Unidas responsabilizaram várias das suas agências pelo apoio aos deslocados internos e o ACNUR ficou responsável pela sua protecção, gestão dos campos e pelo fornecimento de tendas colectivas de abrigo.

Diário Digital / Lusa

09-06-2006 0:35:00

http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?se...&id_news=231608

Help Darfur