sábado, janeiro 14, 2006

A Cauda...

Se tivermos em conta a cadeia alimentar, e o modo como a espécie humana aprendeu a dominar o meio de acordo com as suas necessidades, podemos definir a origem do Homem como predador, mas não sei se será correcto definir essa condição como um fim a atingir, pelo menos como único fim. A ser verdade, será caso para afirmar que a humanidade anda em círculos, que a evolução mais não significa do que um mero regresso às origens. Há filósofos que defendem esta tese, mas não tem de ser a única viável. Se o poder do predador deriva naturalmente da sua maior inteligência e da falta dela nas presas, convém lembrarmo-nos de que um predador médio pode facilmente transformar-se em presa de outro predador maior (ou mais poderoso). Tal observação conduz facilmente a juízos falaciosos como: todos aqueles que conseguiram conquistar o poder (predadores) são inteligentes - todos os oprimidos (presas) são falhos de inteligência.
A nossa experiência de observadores das disputas dos nossos políticos, em épocas de campanha eleitoral, mostram-nos, muitas vezes, quão falacioso é o juízo atrás enunciado, pois a conquista do poder, por si só, não é factor determinante de inteligência. A manutenção do poder conquistado é que o poderia ser. E essa manutenção, num regime democrático, depende do bom uso... Logo, vencer as eleições não significa ser mais inteligente do que o adversário, ou que o cidadão comum, se numa eventual recandidatura o poder passar para as mãos de outro. Significa, tão só, que o predador que ocupava o poder foi, de algum modo, "castigado" pelo vulgo - e das duas uma: ou foi desastradamente incompetente no exercício da predação (não sabendo, por exemplo, rodear-se de pessoal da sua confiança) ou, não tendo sido completamente incompetente, terá sido desastradamente ganancioso, não conseguindo disfarçar, aos olhos do público, o seu carácter de predador.
Por outro lado, a dicotomia predador/presa fazia sentido no tempo em que a actividade humana se caracterizava pela caça e recolecção. Essas características ainda permanecem, mas disputam o seu lugar com outra: a capacidade de construir, de criar. Ao criar, o Homem define-se mais como fundador do que como predador. Não se trata de negar o que existe, no Homem, de comum aos outros animais, mas também não podemos negar o que nele há de diferente, que é a capacidade de se interrogar sobre a razão da sua existência: será que só estamos aqui para nos "predarmos" uns aos outros, ou para fazermos algo mais? Será que nos movemos apenas pelo instinto? Qual o papel da razão em todo esse processo? Será que a nossa capacidade pensante nos serve, apenas, para concluirmos que não somos diferentes dos seres que não pensam?

Talvez não fosse má ideia que a espécie humana se deixasse de andar em círculos, a tentar "caçar" uma cauda que já não tem...

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